Ainda há finais felizes

19:03

Por Guida Alves*

Ao longo da minha prática profissional, cruzo-me com crianças infelizes em famílias quase perfeitas e verdadeiras heroínas que, inexplicavelmente, ultrapassaram tudo. São estas últimas que nos fazem ganhar alento e continuar a acreditar que a felicidade ainda existe. Gostava de partilhar convosco a história real de Francisco (nome fictício), de 15 anos, que nasceu numa aldeia na periferia de um grande centro urbano, o mais novo de um grupo de cinco. Era o último numa casa pequena, sem luz, com água de captação natural, onde a pouca mobília incomodava o bailado de tantas moscas que por ali andavam e que era difícil de não colidir com uma dúzia delas quando ali entravamos. Num pequeno quarto, jazia a mãe de Francisco que o infortúnio da doença e a obesidade a lançou à cama. Com um pai alcoólico, cabia a Francisco cuidar da higiene da mãe, esvaziar a velha lata de tinta que servia agora de contentor para as fezes e urinas. Francisco cuidava da casa e da roupa. A escola nunca percebeu que aquele simpático e educado jovem lavava a sua própria roupa à mão, estendia de imediato para atenuar a falta de ferro de engomar e que cozinhava as suas refeições e a dos pais. Francisco cuidou da mãe até aos seus últimos dias e que preocupada com o futuro do filho tentava encontrar soluções. Colocou-se a hipótese da entrada para a Marinha, a garantia de um teto e alimentação para o filho, alegrou os últimos dias da mãe de Francisco. Partiu antes de ver o seu desejo concretizado, mas Francisco não defraudou o pedido da mãe: só não entrou para a Marinha porque nunca contou a ninguém que não sabia nadar, o que fez com que tivesse entrado para o Exército. Hoje, homem feito, tem a sua família e representa aquilo a que denomino os “sobreviventes do holocausto familiar”. Era óptimo que este exemplo perdurasse para além do tempo e que epidemicamente nos contagiasse de solidariedade, respeito por nós e pelos outros e acima de tudo pela manutenção e solidificação base de qualquer sociedade, a família.

*psicóloga

A depressão tem cura

23:35

Por Guida Alves*
A tristeza é um sentimento que podemos vivenciar ao longo da nossa vida. No entanto, quando associada a outras sintomatologias, a tristeza poderá ser uma das muitas características da depressão. A tendência para desencadear a depressão nos períodos de inverno é maior. Os dias mais pequenos desviam-nos de um maior contacto e convívio com os outros. Mergulhamos num maior isolamento e, consequentemente, podemos desenvolver uma maior propensão para desencadear pensamentos negativos, sentimentos de menos valia e tristeza profunda .
Não havendo curas milagrosas, há algumas atitudes que poderão evitar ou diminuir a tendência para a tristeza profunda ou depressão. A título de exemplo: devemos manter o contacto junto de familiares e amigos que nos estimam; podemos exercitar o corpo; aliviar a mente, com as aulas de grupo em ginásios; entre outras alternativas. As aulas de dança são uma ótima ideia, porque estimulam o contacto entre pessoas. Tudo isto ajuda, no fundo, a libertar energia, a desanuviar e a focar-se noutros assuntos. O que interessa é que faça algo que lhe dê prazer e faça sentir-se bem. Contacte com a natureza e desfrute do meio envolvente. Faça uma lista daquilo que é mesmo importante para si e daquilo que não contribui para o seu bem estar e estes últimos itens elimine-os da sua vida! Consulte um especialista e faça psicoterapia. Isso irá ajudá-lo a superar as suas dificuldades e a fortalecer imagem de si próprio. Lembre-se, cuide de si, porque cada um de nós é único.
*psicóloga e escreve na gira.

Chorar é tão importante como rir

20:17



Novembro é a altura de recordar os mortos, mas não podemos esquecer os vivos! O ser humano, pelas suas capacidades intelectuais, tomou consciência de que a maior certeza que tinha na sua vida era a morte. Num mundo  cheio de desigualdades e injustiças, a mortalidade é aquilo que nos une.
O segundo dia deste mês é dedicado a homenagear todos os que já partiram e reflectir sobre isso é pensar na experiência mais dolorosa  e intensa que um ser humano pode viver. A tristeza  e o desgosto para os que ficam é uma reação natural e emocional por uma perda significativa, a que chamamos luto. O  processo, invariavelmente, passa pela negação, choque face à  perda, tristeza e a aceitação da perda, que cada um vai vivenciar de uma forma muito própria. Lamentavelmente não existem fórmulas mágicas, mas há estratégias que nos ajudam a ultrapassar este período, entre elas o acompanhamento psicológico. O luto torna-se patológico quando ao fim de seis meses a um ano o indivíduo não aceita a perda e reage como se a mesma não tivesse acontecido. Os amigos e familiares numa tentativa de colmatar o sofrimento utilizam frases que nem sempre são as melhores: “não fiques assim” ou “não chores”. A intenção até pode ser boa, porém é uma má estratégia. Contrariamente àquilo que o senso comum propõe, devemos falar sobre a pessoa que perdemos, recordar os momentos mais marcantes e os mais divertidos. Falar sobre a pessoa que perdemos faz-nos bem, mesmo junto das crianças, usando uma linguagem simples e naturalmente devemos falar sobre quem partiu, devemos inclusive chorar, se sentirmos vontade de o fazer. Existe algum preconceito quanto ao chorar diante dos outros, talvez porque revele alguma fragilidade. Todavia, este é um ato tão importante como rir quando sentimos vontade. Reprimir afetos, sentimentos ou formas de os expressar, nomeadamente o chorar, só vai atrasar ou tornar o processo de luto mais doloroso e potencialmente mais patológico. É importante recordar os mortos, mas não podemos esquecer os vivos!

Dormir é bom remédio

10:57


Para a generalidade das famílias com filhos em idade escolar, estes meses são sinónimo de retomar da “normalidade”. A importância das rotinas na vida das crianças é tanto  ou mais importante quanto satisfazer o apetite, ir à escola ou receber afeto. E o sono desempenha um papel fundamental. Alguns pais não entendem o quanto é importante o hábito de ir dormir e as rotinas a ele associados, que devem ser bem definidos e mantidos todos os dias pela mesma sequência: tomar banho, vestir o pijama, comer, lavar os dentes, deitar, ler uma história, até adormecer.
Façamos nós um pequeno exercício de faz de conta para melhor entender a importância das horas de sono: imagine-se a deitar todos os dias às 2h/ 3h e levantar-se por volta das 6h/7h. Com poucas horas de sono experimente ir para uma ação de formação, uma reunião de equipa ou atender uma vastíssima clientela de uma loja durante todo o dia. Imaginou? Ótimo, então como se vai sentir? Sem paciência, irritado, com vontade de sair do local, intolerante, mal humorado, etc. Pois bem, uma criança que não durma o suficiente vai ter estes sintomas durante o dia, com a agravante que não tem a maturidade suficiente para se controlar nem a capacidade de compreender as razões da sua irritabilidade. Some a este conjunto descrito anteriormente a adaptação ao meio escolar, aos amigos (com esta e outras problemáticas) que também estão na escola e à motivação escolar, entre outros fatores.
Frequentemente ouço os miúdos a dizer que veem a última novela da TV ou a série X ou Y. São programas que acabam muito para além do horário aceitável. Alguns professores também relatam comportamentos que denotam a falta de rotina nos hábitos de sono. Muitos pais em contexto de consulta referem que ”ele não quer ir para a cama”, ou que ” ela só se deita quando nós nos deitamos”, entre outras. As crianças não têm querer quando se trata do seu bem estar físico e emocional, ou os pais também perguntam a um filho que tenha febre descontrolada se quer ir ao médico? Creio que não. E quanto à segunda afirmação de só irem para a cama quando os pais vão, pergunto: porquê? Têm os pais os mesmos deveres que os filhos? Tenho a certeza que não.
Existem formas de criar rotinas e educar as crianças no sentido de  dormirem cedo e de preferência à mesma hora, podem até ser trabalhosas, mas basta os pais aplicarem-nas. Excluindo as questões de perturbações graves de sono, que podem ter outros factores inerentes, dormir bem é bom,  contribui de forma determinante  para o  saudável equilíbrio dos indivíduos e é um excelente remédio para prevenir muitos males.